sexta-feira, 9 de maio de 2014

Lula, Dilma e o Cavalo de pau

É duro dizer, mas quem tem poder de mando no governo está aparelhado com a ditadura incrustada no setor elétrico. Isso torna o governo extremamente frágil. Incapaz de exigir que ao menos as famílias deslocadas à força tenham seus direitos plenamente assegurados.

Por Antônio Claret
Conta-se que Lula, no início de seu governo, fora alertado por alguns de seus correligionários sobre necessidade de mudanças estruturais profundas e que ele, em tom de galhofa, afeito ao consenso de classe, respondera que não se dá um Cavalo de pau num Submarino.
A frase, saída ou não de sua boca, sintetiza bem o seu governo e de sua sucessora, Dilma Roussef. O namoro íntimo oficial e extra oficialmente com a classe dominante se justifica em nome da governabilidade.
O Ministério de Minas e Energia, estratégico para a soberania do país e para a liberdade do povo brasileiro, continua nas mãos de grupos que representam uma herança arcaica e perversa no campo político-partidário e no econômico. Eles são, claramente, contra o povo e contra a classe trabalhadora.
Quando o Lobão uiva, ele o faz em nome de toda uma alcatéia que manda e desmanda em diversos estados brasileiros. Alguns têm o pé, a cabeça e o coração fincados na Ditadura, ainda que tenham aperfeiçoado o seu discurso. Haja vista a situação penosa das famílias empobrecidas do Maranhão, dominado pelos Sarney, e dos presos, em situação especialmente subumana. Diante dele, do MME, os outros ministros e seus colaboradores abaixam a cabeça e se desculpam, e choram, e dizem do que estão tentando, mais parecidos com agentes filantrópicos do que com governo.
A lógica da Ditadura persiste arraigada na estrutura do setor elétrico brasileiro. Não existe nenhuma lei que assegure o direito das famílias atingidas, a não ser um decreto da Década de 40 (Getúlio Vargas) que fala do direito dos proprietários. As empresas barrageiras comumente recorrem ao Interdito Proibitório, também resquício do período ditatorial. A área de implantação de barragem é considerada área de Segurança Nacional, triscar nela é terrorismo.
Todo esse arcabouço dos tempos de chumbo explica, em parte, o que ocorre em Belo Monte: operários confinados; Força Nacional instalada dentro do canteiro de obra; Reassentamento Urbano Coletivo, conforme consta do PBA, transformado em loteamento, com casas de concreto de durabilidade e qualidade duvidosas, sem urbanização, sem estruturas garantidoras das políticas públicas básicas e sem os meios de subsistência das famílias; abandono de indígenas, pescadores, camponeses e outros à sua própria sorte.
É duro dizer, mas quem tem poder de mando no governo está aparelhado com a ditadura incrustada no setor elétrico. Isso torna o governo extremamente frágil. Incapaz de exigir que ao menos as famílias deslocadas à força tenham seus direitos plenamente assegurados. Incapaz de garantir que Brasil Novo, município atingido pela barragem, tenha um hospital público para o povo deixar de ser vítima de hospital particular. Capaz de permitir que a Norte Energia brinque de fazer aquela política rasteira de um poço d’água aqui, uma escolinha ali, e publique no seu Blog a redenção do Xingu. Essa é uma coisa imperdoável!
Está claro que o Partido dos Trabalhadores chegou ao poder, mas não tomou o poder. Está evidente que o governo atual tem disposição para gerenciar bem a crise capitalista e tem algum fôlego para levar para o povo o farelo da super exploração dos trabalhadores e da natureza. E isso é bom! Mas é fato inarredável, também, que esses programas sociais – que são bem-vindos - dificilmente se firmarão como Política Pública. Eles são a outra face dos super lucros. Eles só subsistem nesse clima favorável ao capital, com parcerias público-privadas – outro nome da privatização -, com flexibilização dos direitos trabalhistas, com avanço do Agronegócio, de construção de barragens, de exploração desordenada de minério, de desmatamento e assim por diante. Os indígenas, particularmente, sofrem essa pressão, com a demarcação de terras parada e com retrocesso nos seus direitos conquistados graças a lutas históricas.
O preço do desenvolvimentismo tem sido grande, e a dívida com o povo impactado pelas barragens, pela mineração, pela soja, pelo gado, vai ficando maior do que os programas sociais. Na Amazônia, particularmente, o entreguismo é de tal monta, o neocolonialismo é tão presente que, na prática, desenvolvimentismo e neoliberalismo são a mesma coisa.
Esse ambiente neoliberal possibilita agora, no Pará, uma aliança entre o Partido dos Trabalhadores e os Barbalho. O PT abre mão de candidatura própria e apóia o candidato deles a Governador. A base do partido vem chiando, mas parece que tudo já está acertado. Pode até ser tático, mas é indigesto.
Tudo bem! Vamos que Lula e Dilma não dessem um Cavalo de Pau no Submarino para não capotá-lo de vez. Mas que ao menos detivessem os submarinos piratas, os superávits primários, a sangria de nossas riquezas, o retrocesso em direitos historicamente conquistados.
Não sinto nenhuma saudade nem das cebolinhas do Egito e nem da Era FHC. Não sinto, também, nenhuma simpatia pelo esquerdismo para o qual está tudo errado, mas insiste no mesmíssimo caminho, apostando suas melhores fichas na lógica eleitoral, sem trabalho de base e sem enraizamento entre o povo. Mas sinto saudade do Cavalo de pau, que não houve. Sinto saudade de uma postura determinada (que não houve) desde o início do governo Lula, buscando garantir, por exemplo, Reforma Agrária e controle da energia, em toda a sua cadeia, da produção à distribuição. Faltaram-lhe vigor ideológico e  clarividência de outros líderes da América Latina? Faltou-lhe força por causa do arranjo político tão amplo? Os especialistas vão dizer!
As imagens da eleição e posse de Lula, com o povo na rua, são fortes demais, e poderiam, sim, ter dado um baque no Submarino. A um sinal do Palácio, o povo atenderia certamente com prontidão. Haveria uma reação imediata das oligarquias locais associadas a impérios econômicos mundiais, mas, sinceramente, não sei se haveria clima para um golpe de Estado. Talvez.
Ah que vontade que tivesse havido senão um Cavalo de pau, ao menos um jeguezinho! O Xingu, o Tapajós, povos inteiros poderiam, um dia, estar fora das garras do capital. Pois um Jegue com a força popular tem mais peso do que qualquer império.
Esse tempo adiado está em nossas mãos!
Fonte: http://www.mabnacional.org.br/

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